"Navegar é preciso"
- Adenilson Barcelos de Miranda
- 16 de jul. de 2024
- 4 min de leitura
Atualizado: 5 de ago. de 2024
Visita técnica realizada no município de Urucurituba/AM em agosto de 2023

Com o ventre dentro d’água e o dorso exposto ao sol, a lancha seguia rio abaixo, o rio que atende pelo nome Amazonas, o maior do mundo. Não estava sozinho; eu acompanhava o professor David Xavier, hoje coordenador geral de Saúde Digital e Inovação, que na região atuou como diretor do Centro de Estudos Superior de Parintins, no estado do Amazonas. Embarcamos em um avião e partimos de Brasília com destino a Manaus. Por terra, fomos de ônibus até a cidade de Itacoatiara, de onde seguimos pelo rio Amazonas com destino à cidade de Urucurituba. No final de uma tarde agradável, vi surgir na linha do horizonte a cidade ancorada na margem direita do rio Amazonas.
Navegando naquelas águas, recordei um poema e seu emblemático título: “Navegar é preciso; viver não é preciso”, do poeta português Fernando Pessoa. Diante dessa frase, podemos ser levados a acreditar que a vida é insignificante. A frase, de acordo com o historiador Plutarco, foi proferida por volta de 70 a.C. por Cneu Pompeu Magno, diante de um dilema: enfrentar os riscos da navegação para garantir o abastecimento de trigo em Roma ou se manter vivo na cidade de Sicília e, por consequência, deixar Roma perecer em uma grave crise de abastecimento. Nesse contexto, navegar se tornou uma decisão fundamental para a preservação da vida dos cidadãos de Roma; enquanto fugir dos riscos da navegação, visando somente garantir a própria vida, era um ato deliberado de condenar Roma à morte. Assim, Magno tomou a decisão de navegar para salvar Roma e soprou aos ares a quem o ouviu: “navegar é preciso, viver não é preciso.”
Invocando o passado, o poema de Fernando Pessoa nos revela a vida numa perspectiva criativa, para torná-la grande ao engrandecer a pátria e a humanidade, ainda que, para isso, o corpo e a alma se tornem lenha desse fogo.

Ainda navegando nas águas do rio Amazonas, rumo à cidade de Urucurituba, lembrei-me de que, dentro da noite escura que habita o fundo do rio, além da Cobra Norato, também se encontra o cabo óptico subfluvial da Infovia 01. Esse cabo hoje integra o Programa Norte Conectado, do Ministério das Comunicações, levando conectividade às cidades de Curuá, Juruti, Óbidos, Oriximiná e Terra Santa, no Pará, além de Autazes, Itacoatiara, Parintins e Urucurituba, no Amazonas. A conectividade significa que cada cidade será contemplada com uma rede própria de internet para atender às políticas públicas de telecomunicações, educação, pesquisa, defesa, judiciário e saúde.
Foi nesse contexto que, no dia 7 de agosto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva inaugurou a Infovia em visita ao navio hospital escola Abaré, a primeira unidade básica fluvial do país. Do navio, a ministra da Saúde, Nísia Trindade, anunciou a ampliação do acesso à saúde por meio da Saúde Digital. O presidente Lula ouviu os relatos das cidades contempladas com os serviços de Telessaúde, decorrentes da conectividade proporcionada pela Infovia 01. Após ouvir os relatos, o presidente Lula nos revelou um velho sonho: conectar o Brasil, tanto na educação quanto na saúde. Diante dos relatos dos usuários dos serviços de Telessaúde, o presidente Lula sentiu que a Saúde Digital é um meio de proporcionar um sistema de saúde mais acessível e equitativo para as populações vulneráveis, ainda que distantes dos grandes centros urbanos.

É preciso lembrar que, no dia 7 de julho de 2006, na cidade de Parintins, hoje contemplada pela Infovia 01, foi realizado o lançamento do Projeto Piloto de Telessaúde, que, à época, foi apresentado como um modelo-conceito para demonstrar ao Ministério da Saúde a viabilidade tecnológica de se implantar a Telessaúde na região amazônica. Foi a partir dessa experiência exitosa no estado do Amazonas que houve a elaboração da portaria para a criação do Programa Nacional de Telessaúde. Quem estava à frente desse marco da Saúde Digital no Brasil? A professora Ana Estela Haddad e o professor Cleinaldo de Almeida Costa.
“Ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio”; houve avanços na Telessaúde e, em meio aos desafios, houve uma resposta política para uma atenção especial à Saúde Digital na pauta do Governo Federal. Nas águas do rio, a professora Ana Estela Haddad se tornou secretária de Informação e Saúde Digital (SEIDIGI/MS), enquanto o professor Cleinaldo de Almeida Costa se tornou o diretor do Departamento de Saúde Digital e Inovação (DESD/SEIDIGI/MS).
Na pequena cidade de Urucurituba, conheci um poeta e técnico de informática que teve um papel relevante no acolhimento da Infovia na cidade, Eliel Santos. Em meio a cores e encantos sobre o município, Eliel me apresentou seu livro intitulado “O Sonhador Andante”. Ao abri-lo, deparei-me com o poema que transcrevo abaixo:
Cidade Pequena Meu coração é uma cidade pequena
E o teu amor, um estrangeiro recém-chegado
Pouco a pouco tu exploras; estrangeiro amado
E me conheces por inteiro.
Posso sentir em cada esquina minha
A doce e familiar emoção que tua presença sutil me causa
É tão bom ser tua morada
Tua casa
Que quase não me lembro
Em que dia tu chegaste.
Em Urucurituba, somos todos estrangeiros. Na Secretaria de Informação e Saúde Digital (SEIDIGI), é consenso que “navegar é preciso”, pois cidades como Urucurituba nos ensinam que a Saúde Digital tem a capacidade de proporcionar saúde nas dimensões da vida.
Aprender é uma dimensão dos professores e também do presidente. A quem estava atento ao lançamento da Infovia 01, percebeu que foi diante do relato de experiência de quem tem o coração como uma cidade pequena que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o “sonhador andante”, sentiu por inteiro a essência da Saúde Digital: “navegar é preciso; viva o SUS”.
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