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O Mistério de Raiane

Adenilson Barcelos de Miranda

Raiane ocupava seu posto na ouvidoria com a serenidade de quem já havia atravessado milênios de história. Sua presença, ao mesmo tempo acolhedora e enigmática, fazia da sala destinada à recepção da ouvidoria um espaço que transcendia o tempo. Ao alcance dos olhos, Raiane se encontra atrás de um vidro que mais era uma superfície translúcida, que deixa a luz entrar em um tempo em que tudo era pedra.


Cada pessoa que adentrava o edifício, ao avistá-la, era tomada por uma sensação de reverência, como se estivesse na presença de uma rainha, embora ela fosse simples em suas palavras e gestos por trás de um vidro e acolhedora no sorriso.


Os cabelos cacheados de Raiane, com fios dourados que refletiam a luz do sol, traziam à memória uma ancestralidade que remontava ao antigo Egito, quando fios de ouro adornavam os cabelos, razão pela qual atualmente as mulheres aplicam nos cabelos um procedimento chamado “luzes”. Havia algo de divino e intocado em sua aparência, como se os deuses a tivessem moldado à imagem das mulheres sagradas que outrora caminhavam ao lado dos faraós. Assim como Khamerer-Nebti, que ao lado de Menkaure abraço o rei fortalecendo-o com sua presença, Raiane também parecia envolver a todos com uma aura de proteção e sabedoria.


Apesar da modernidade do ministério onde trabalhava, era impossível não perceber a atemporalidade que Raiane emanava no prédio revestido de mármore branco, tal como as pirâmides um dia foram. Enquanto ouvia pacientemente as demandas e as dúvidas que lhe eram trazidas, parecia consultar uma voz interior, uma voz que ecoava desde as margens do Nilo até os corredores frios do prédio governamental. Essa voz, que só ela escutava, lembrava-lhe constantemente de quem era, uma mulher com raízes profundas, conectada a uma linhagem de mulheres que, desde os primórdios, eram vistas como sagradas, portadoras de uma força que transcende o entendimento comum.

Ao cumprimentar as pessoas que chegavam, Raiane irradiava um mistério. Não era apenas o brilho dourado de seus cachos ou a profundidade de sua pele que capturavam a atenção.


Era algo além do físico, algo que habitava em seu olhar, em seus gestos e em sua maneira de estar no mundo. Talvez fosse o conhecimento silencioso com a qual nos deparamos em Khamerer-Nebti, detentora de um poder que as sociedades modernas parecem ter esquecido.


Raiane sabia que seu papel na ouvidoria ia além de simplesmente ouvir. Ela era uma guardiã, uma ponte entre o presente e um passado longínquo, onde o feminino era reverenciado. E, enquanto acolhia as vozes externas, ela própria se nutria de sua voz interior, mantendo viva a chama de uma ancestralidade que continuava a guiar seus passos.


Assim, Raiane permanecia ali, na ouvidoria, irradiando sua luz, uma mulher de mistérios profundos, uma rainha moderna com raízes no antigo Egito, acolhendo todos que chegavam com a mesma força e proteção que suas ancestrais ofereciam aos reis.

 
 
 

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